sábado, 14 de abril de 2018

Seguia, 
humano,
a pulsão desejante. 
O novo lhe deslumbrava
Como intrínseca que era 
Sua sede pela busca.
A despeito de tudo o que experimentava desimpedido,
Queria um novo
Que desta vez 
lhe pertencesse. 
Um êxito, 
Construção de agradável rotina.
A passos largos 
Vislumbrou o objetivo 
Erguendo-se bem à sua frente. 
Contudo,
Algo lhe faltava à percepção.
O que poderia ser?
A tela em branco agora lhe fitava,
Intrigante, 
dando-lhe infinitas opções.
Indecisão.
Uma certa pressa em preenchê-la,
Antes que a mente se ocupasse 
Da inquietante solidão 
Que já se camuflava por entre as vísceras. 
Faltava-lhe as cores de antes, 
Aquelas que lhe assistiam
Confidenciar sua fragilidade,
Exigir-se sobremaneira,
Traduzir em linhas o coração,
Exultar-se dos triunfos.
Faltavam-lhe as flores daquele jardim

Que nunca fora seu.
Lavadas as linhas,
Borrando a tinta
Apaga os vestígios
Do mortal pecado.
Eu que sou carne,
Banquete aos teus olhos
Esboço um sorriso medonho
Para escapar do teu juízo.
Revolto-me sem cúmplices,
Entristeço sem esperança.
Turbilhão.
Um tornado levanta os telhados
Sacode cidades.
E eu,
Tempestuo de assombro.
Você não me vê
A nudez é da alma,
Teus olhos são frios demais para compreender.
A chuva vai chegando
Nervosamente
Assim como eu,
Sem brilho,
Sozinha.
“Como um raio de luz,
Você preencheu a minha escuridão.
Me tirou das trevas,
Quando me estendeu a sua mão.
Minha estrela da sorte,
Você passou tão depressa,
Mas eu te percebi,
A garota dos cabelos de fogo,
Olhando para mim,
Foi naquele momento,
Que eu te pedi.
Apenas um desejo,
Que não se pode cumprir,
Como tudo na minha vida,
O destino há de punir.
Gatinha, mudei minhas senhas,
Para os dias que te conheci,
Mas agora minhas lágrimas e soluços,
Me fizeram redefinir.
Maldita dor, que veio do amor.
Se quis me testar, provou seu valor.”
Aparecer meio
Mas ser inteiro
Mesmo que pareça
Meio avesso,
Absurdo.
Contudo
Ser meio assim
Mas não fazer parte,
É ser inteiro
Em si.
Ser todo
No mundo
Ser tudo,
Eu.
Poeminhas
Poe-meus
Me desvendo aos olhos teus.
Entrelinhas
Não têm hora
A dizer-lhe quem lhe adora.
Mais sozinha que um adeus
Vou trocando os passos meus.
Desalinhas
Sem demora
Para o mundo aí afora.
Se caminhas
Como eu
Faças do meu peito o seu.

sábado, 27 de maio de 2017

Não vou mentir,
Meu coração se aquece e vibra
A cada eclipse.
Esse esplendor ressoa ainda
Por dias depois que fecho a porta.
Minhas mãos frias denunciam
Que o fluido vital vive
Concêntrico,
No músculo involuntário.
Mesmo assim me controlo
A mim e à expectativa,
Aprendi a sentir sem exagero,
Sem o torpor do vício
Na sensação esplêndida
Que é conectar-se.
Deveras,
A consciência integral
Que vem de ouvir o coração
Ignora aspectos mundanos
De espera desenfreada
E de desejos sempre insatisfeitos.
Sou grata
Por tudo o que vivi,
E pelo que experimento agora.
Não alimento receios e esperanças,
Só aceito o que vem
Com o coração e a alma aberta.
Não existe medo nem dívidas.
Existe pés descalços
E a vida.

Estive por dois dias entorpecida.
Os efeitos foram passando gradativamente enquanto eu socava meu maxilar em frente ao espelho.
Foi quando minha cabeça soltou-se e flutuou de helio acima dos cúmulos e minha boca escancarou verdades nao sutis.
Eu que sou fluido vi nos teus olhos a minha cor, enquanto você que crepita viu em meu véu algo familiar.
Acreditei que fogo e água podem se encontrar sem grandes revoluções. Assim enganava-me, que estupidez!
Esse é o problema com o vício.

O que me encanta em você, poeta
É sua alma tranquila
Sábia, firme e calma
Mas também tão livre,
criança
com aroma de sonho.
Quero, desejo, anseio,
Espero, desiludo, quase sofro.
Toda vez o mesmo passo
Até conseguir silenciar
Os carrascos internos,
Isolar interferências
E restar o mais puro.
É sublime,
Profunda entrega
Escolho.
Estou aberta para a vida
Meu tempo de morte já passou.

Luz que entra pela janela sorrateira
Invade a caverna escondida
Onde cantam suspiros acalorados.
As flores que velam o sono são as mesmas
Que presenciam os devaneios e os espasmos
Mas não imaginam o que anseiam os amantes.
Jardim secreto, paraíso perdido
E todos os demais clichês que se encaixem
Para tentar definir a insanidade que é o desejar.
Sutileza de tons,
de sons,
Toques e fragmentos da alma que se desnuda,
O dia em que o poeta virou poesia.

quinta-feira, 5 de janeiro de 2017

Lucas Patschiki



Eu com a minha dificuldade absurda de aceitar e entender a morte como parte inevitável da vida, demorei alguns dias para poder escrever tudo o que venho pensando. Tenho procurado lembranças de quase 12 anos atrás, quando convivi com esta pessoa que já não faz parte deste plano. Apesar de não nos falarmos mais, me dói o coração saber que ele se foi, por tudo o que ele era e também pelo pouco e intenso tempo que passamos juntos. Nos conhecemos na faculdade de história, ele era meu calouro. Sempre rindo, falando bobagens ou discutindo sobre capitalismo ou bandas de metal, aquele menino simpático, desarrumado e algo depressivo me chamava a atenção. Nos aproximamos por amigos em comum, pela luta estudantil e por frequentarmos os mesmos lugares. A primeira vez que lembro de ter tomado a iniciativa foi quando, num Vinho e História, apreciei mais uma vez sua inteligência e senso de humor e o convidei para dar uma volta. Rodamos a cidade andando sem rumo, nos beijamos com receio e começamos a namorar. Lembro de estar confeccionando cartazes para as eleições do DCE e ele falar da minha genialidade, quando na verdade o gênio era ele. Aliás, "genial", "fabuloso" e "muitoo foooda" falado assim com entonação eram seus adjetivos preferidos.
O Lucas inventava histórias e acreditava nelas, era complicado discutir com ele. Falava muito sobre suas ideias, mas raramente dava o braço a torcer. As calças largas de moletom com chinelo de couro denunciavam sua simplicidade - não estava nem aí com isso - e as camisetas que eram lavadas na pia do banheiro cheiravam a umidade e escancaravam que morava sozinho. Era um ótimo amigo, generoso e extremamente sensível. Falava pouco sobre sua vida, mas me contou sobre uma namorada chamada Marisol a quem amou e sofreu, e sobre sua família ser meio distante e raramente se encontrar em casa, pois cada um só ficava no seu quarto. Simpatizava com história nazista e tinha uns conceitos distorcidos, embora fosse só teoria. Tinha projetos de música com alguns amigos, um deles de quem gostava muito e admirava pois entre outras loucuras tinha cheirado pinga. Um dia fizemos choconhaque na sua casa. Tinha muita gente espremida na sala comercial fechada por cortinas que lhe servia de kitinet. Ao som de Paradise Lost, bebíamos, conversávamos e ríamos, como se nada mais existisse. O Lucas fumava muito e durante o tempo que estive com ele eu fumava também. Íamos comprar cigarro perto da casa dele, num mercadinho que parecia ter parado nos anos 70. Eu tinha um diário-fotolog que infelizmente não existe mais e era recheado de lembranças deste tempo. Só consegui recuperar um texto da madrugada de 07/07/05, em que eu contava o quanto ele estava me ajudando com os trabalhos da faculdade e o tempão que ficávamos conversando no telefone. No final dizia assim:

O Lucas tava um amor hoje,
me ajudou um monte.
Ele é sempre tão legal,
e eu queria uma foto dele
junto comigo
pra colocar no flog.
Ainda convenço ele
a fazer um moicano.

Ele fez um corte de cabelo singular, inspirado em outro amigo nosso. Raspou o cabelo só de um lado e deixou o resto mais comprido. Assim ganhava atenção em qualquer lugar que fosse. Foi até tema de um 'funk' que eu e minhas amigas compusemos sobre a moda. Uma vez pintamos o rosto com pancake branco e fomos para a universidade participar de protestos. Depois fomos para a casa desse amigo e enquanto ele tomava banho, ficamos na sala esperando. Quando a mãe dele chegou nos viu sentados juntos e imaginou outra coisa, dois palhaços maquiados ali na sala dela. Ficamos muito sem jeito, mas depois rimos até doer a barriga da situação.
Com seu gosto estranho, ele dizia que adorava as minhas olheiras. Uma vez quando conversávamos sobre o acervo de processos crime da UEPG ele falou sobre uma lenda urbana, em que uma aluna encontrou o processo de julgamento do assassinato de um familiar. Então lhe contei que a lenda era real e que fui eu que vi as fotos do meu avô assassinado em 75. Ele ficou eufórico!
Tentei me lembrar como ele me chamava. Foi difícil, a memória não ajuda. Pensei que era "menina ... alguma coisa", mas num estágio de quase sono ontem ganhei o presente de lembrar, era "minha garota sexy". Também lembrei das suas mãos sempre trêmulas, os dedos permanentemente amarelos de cigarro, sempre batucando solos de bateria nas mesas ou no ar. Vejo como se fosse hoje sua imagem com um sorriso tímido, sempre tentando se proteger. Acho que foi por isso que pouco tempo depois que tudo começou ele me levou até a sua casa e me devolveu um presente que eu havia dado, e nos colocou um ponto final. Fiquei sem entender, ele só me disse que não daria certo. Fui pra casa baqueada e escrevi um poema com o seu nome:

LUCAS

Na hora em que um ponto final
Promete acabar com a dor,
No momento em que quase tudo
Chega ao fim,
Duas pessoas evitam olhar-se.
Uma tentando ser mais forte que a outra,
Mesmo que cada palavra que digam
Posso soar como falsa superioridade.
Só para mostrar que está bem.
E começam a inventar palavras,
Dizem frases normais,
Como uma fuga do passado próximo.
Duas almas machucadas,
Dois olhares frios,
Rasos,
Dois corações assustados.

A minha dificuldade era entender o que tinha acontecido. Ainda alguns dias depois escrevi o que segue:

DOS DESTINOS PERTURBADOS

Ele estava estranho.
Mais estranho que todas as outras vezes que o tinha visto.
Eu tentava não perceber,
Mas sabia que tinha me tornado um nada para ele.
Pensava que poderia ter volta,
Mas no fundo não acreditava tanto nisso.
Tentava entender como de um dia para o outro o sentimento acabou.
Restou só a pena
Do que parecia ser tão importante.
Procurava um motivo, milhares.
Mas não via um erro em meus atos.
Não há certo e errado quando se trata disso.
Enquanto ele falava,
Ou calava,
Ou olhava para longe para não ter que olhar para mim,
Eu sentia tudo desmoronando.
Meu peito apertado, mal podia respirar.
O desespero tomou conta de mim.
Até tentei pensar em outra coisa,
Que haveria outra saída.
Mas não havia.
Tentei conversar,
Explicar o que não tinha explicação.
Mas para ele, nada de mim importava,
Só continuar sua vida,
Exatamente como antes.
Afinal,
Eu não signifiquei nada importante,
Só mais um alguém.
Vi que nada adiantaria,
Tinha ferido meu orgulho,
Chorado,
Sofrido.
Com isso,
Meu valor diminuiu ainda mais
Diante dos olhos que eu via se fechando ao me beijar.
E era só vontade.
E eu pensei que fosse mais.
Ele ainda me pediu desculpas
E sua piedade me destruiu.
Naquele instante eu morri.
Deixei sua casa,
Sua vida,
Sua lembrança.
Não voltaria jamais.
Nunca mais seria a mesma.

Depois disso não consigo me lembrar o que houve, nos esbarramos outras vezes e foi estranho. Escrevia sempre sobre ele e sobre nossas divagações e conversas, foi um período muito fértil, inspirador. Mais tarde publiquei um livro chamado Morbidez e Insanidade, do qual ele nunca ficou sabendo.
Até que hoje encontrei um email que nem me lembrava:

Com toda a sinceridade gostaria de me lembrar do desfecho, da carta, de que tipo de humilhação ele me fez passar neste episódio da praça. Mas depois disso, minha mente apagou completamente. Só consigo ver que poucas semanas depois eu estava namorando outra pessoa. Nos falamos ainda poucas vezes na universidade, mas nunca sobre nós dois. No ano seguinte saí com os colegas da turma tomar umas cervejas e o Lucas estava junto. Bebemos muito, cantamos alto "I'll be there for you" do Bon Jovi entre outros clássicos na jukebox de um bar. Quando íamos embora ele falou algo que não lembro sobre meu namorado. Não gostei e esmurrei o seu ombro, mas machuquei minha mão e ele não sentiu nada. No outro dia apareci com a mão enfaixada e ele morreu de rir da minha cara. 
Veio a formatura, fomos cada um para seu destino e nunca mais conversamos. Vi que no seu antigo blog cheio de preconceitos e humor negro ele havia publicado alguns textos com ofensas a mim, mas com muita cara de opinião de terceiros que mal me conheciam. Não achei graça nenhuma, mas não protestei, pois já não tínhamos mais contato.
Alguns anos atrás tive notícias dele por uma amiga. Disse que estava se dando muito bem na vida profissional, fazendo mestrado, namorando uma professora da universidade e muito feliz. Fiquei contente e surpresa, pois apesar de conhecer seu potencial, achei que ele não teria foco para levar tudo a sério. Pois levou até demais, se tornou uma figura importante na releitura da historiografia marxista e da luta de classes. Participou ativamente de movimentos sociais, fazendo análises do momento histórico contemporâneo através da mídia e da internet. Nada mais original.
Todas essas lembranças me trazem um pouco de saudade deste tempo, me deixam pensando nos motivos que nos levaram a fazer o que fizemos, de sermos desprendidos desta maneira. Quando acordei com a notícia da sua morte, tão jovem vítima de um AVC, comecei a resgatar essas memórias. Tive muita tristeza, pelo que fizemos de errado, pelo que deixamos de fazer, pela amizade que se perdeu. Coloquei-me no lugar de sua esposa, tendo que enfrentar o vazio deixado por ele, das piadinhas infames e dos protestos que não terá mais que escutar. Chorei por imaginar a dor de tamanha perda, uma vez que nos últimos anos também me preocupei com problemas de saúde do meu marido. Se pra mim com essas lembranças já está difícil de acreditar, fico imaginando pra ela que terá que conviver com a gigante ausência de um cara espaçoso como ele era.
Não pensei num fim certo para escrever para essa história, porque não havia roteiro. Compilei tudo sobre eu e o Lucas nessas linhas para que jamais me esqueça novamente o quanto ele foi especial na minha vida. Que apesar do seu ateísmo e ceticismo, ele seja recebido num bom lugar e reconhecido por sua bondade. E se um dia ele se lembrar de mim, que seja pelas coisas boas que passamos juntos. Que sua família encontre algum alívio para este sofrimento, e que meu coração possa me perdoar pelos erros que cometi.
Tenho certeza que toda vez que ouvir "One Second" vou me lembrar do que ele me disse em nosso melhor e no pior momento.
"Hold back the tears that could fall for me."




terça-feira, 20 de dezembro de 2016




Entre sonhos e lembranças te visito no silêncio,
e ali perco o tempo agarrada em teus braços.
Sem calma, posto que a saudade e a vontade não sabem medir.
Enquanto espero, meu corpo expulsa o ar
Querendo encher-me de ti quando seus mantras soarem,
Mas quando eles vêem
um sorriso se desprende dos meus lábios,
estes, que vivem apenas para desejarem os teus,
O corpo falha, das pernas aos olhos que agora se governam.
Esqueço-me de respirar,
uma vez que te suspiro,
em palavra ou expectativa.

segunda-feira, 19 de dezembro de 2016

Com um turbilhão meu corpo recebe as palavras tuas.
Pelas ruas e canais, vivo a te procurar, mas quando olho para o lado é que a tua voz fala.
Estonteio, tremo, caio morta, tudo para acordar e ver teu rosto novamente.
Que é tão familiar mas tão distante.
Que já povoou dias e sonhos.
Se o desejo falasse, nesta hora estaria a sussurrar-lhe aos ouvidos quantos dias desbravaria contigo, quantas noites lhe seria constelação.
Em tuas ondas viveria a balançar, e o mar...
Ele sempre será nosso alento.

domingo, 14 de fevereiro de 2016

Se percebe que o trem descarrilou quando se vê que cada força puxa para um lado, e as várias voltas não levam a lugar nenhum. 
Quando há diferenças irreconciliáveis, visões tão diferentes que se autoafirmam genuínas...
Estar certo é mais importante que o efeito, que a vida inteira. O passado se torna arma e o futuro se torna uma competição. 
Doar-se já não é mais importante. O que importa é se preservar, autenticar, intensificar. E de um dos lados um espectador grita que este é o caminho contrário. Há que se perder para poder se achar.
Do outro lado, outro argumenta que o combustível é a autossatisfação.
Mas o trem continua parado. E cada vez mais passageiros se cansam e descem. 
Não há previsão de melhora.

domingo, 7 de fevereiro de 2016